Após registrar boletim de ocorrência em Guarabira, no Agreste da Paraíba, a estudante Rayssa de Sá, vítima de um feminicídio na quinta-feira (21), procurou a delegacia de Belém, na mesma região, para recuperar roupas e documentos que estavam na casa que dividia com o secretário de Comunicação do município, Betinho Barros, mas não recebeu ajuda da Polícia Civil, afirmam os familiares. De acordo com o irmão da vítima, Remysson de Sá, ela foi orientada por policiais a conversar com a família do acusado para que a polícia não fosse envolvida, porque o secretário era uma pessoa pública.
"Ela foi para Belém para tentar pegar os documentos dela e as roupas. Ela procurou a polícia de Belém, porém se recusaram a ajudá-la, mandaram ela procurar a mãe dele (Betinho Barros), por ele ser uma pessoa pública. E não queriam causar transtorno a ele e a gestão do município" , afirma o irmão da vítima.
Betinho Barros, de 38 anos, era ex-vereador e secretário de Comunicação de Belém. Antes do feminicídio, o acusado perseguiu e ameaçou Rayssa de Sá através de telefonemas e mensagens de texto. Após matar a tiros sua ex-esposa, ele tirou a própria vida.
Através da assessoria de imprensa, a Polícia Civil da Paraíba informou que vai apurar supostas irregularidades por parte de algum servidor em todo o processo envolvendo Rayssa e Betinho.
"A Polícia Civil adotou todas as providências para o caso, providenciando, inclusive, a Medida Protetiva uma semana antes que ela viesse a ser morta pelo ex-marido. Frise-se, ainda, que foi oferecido a Raysa um reforço em sua segurança, por meio da Patrulha Maria da Penha, mas ela preferiu não ser enquadrada no programa de proteção", informou a polícia.
Remysson de Sá explicou que a relação do casal começou tranquila, mas com o tempo foi evoluindo para agressões verbais até começarem as agressões físicas. A vítima decidiu pedir o divórcio e voltar para a casa dos familiares após uma agressão que a deixou inconsciente.
A mãe de Rayssa, Denúbia de Sá, disse que a estudante fez várias tentativas para acabar o relacionamento com Betinho de Barros, mas ele ameaçava tirar sua própria vida e prometia que iria acabar com as agressões.
“Ele fazia promessas, dizia que ia mudar, que (as agressões) não iam se repetir, mas foi ficando cada vez mais intenso”, afirmou a mãe.
Rayssa cursava Direito na Universidade Estadual da Paraíba, no campus de Guarabira. A família da estudante acompanhava a vítima até ao local e nunca deixava ela sozinha em casa. Segundo a mãe de Rayssa, as ameaças se estendiam para dentro da instituição.
“Quando ela começou a estudar, ele começou a dizer que ia para a faculdade ficar de olho nela, qualquer coisa matava ela lá”, relembrou a mãe.
A Prefeitura do município de Belém, no Agreste da Paraíba, decretou luto oficial por três dias pela morte do secretário de comunicação. Em publicação divulgada no perfil oficial da prefeitura, a gestão municipal, representada pela prefeita Dona Aline, decreta luto "pela partida precoce e inesperada" de Betinho Barros e da vítima Rayssa Kathylle.
Betinho Barros, que já foi vereador na cidade, foi velado com honras na Câmara Municipal de Belém, na sexta-feira (22), antes de ser sepultado na cidade.
Em entrevista à TV Cabo branco, o irmão da estudante, Renan de Sá, criticou o posicionamento da prefeitura e da câmara do município.
“Eu achei um desrespeito com a verdadeira vítima, que foi a minha irmã. Foi uma vergonha. Ele deveria sair do IML direto para o cemitério. Eu fiquei indignado. O luto na cidade deveria ser por ela, não por ele, um assassino”, afirmou o irmão.
A vítima denunciou e pediu medidas protetivas contra Betinho Barros no dia 13 de setembro, na Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher de Guarabira. A vítima recebeu ligações e mensagens com ameaças até mesmo durante o registro da denúncia.
A medida protetiva de urgência solicitada por Rayssa foi atendida no dia seguinte, dia 14 de setembro. O juiz determinou o afastamento do acusado do lar ou local de convivência da vítima, proibindo que ele se aproximasse da vítima e estabeleceu um limite mínimo de 200 metros. Betinho Barros também foi proibido de manter contato com a vítima por meio de ligações telefônicas e envio de mensagens por celular (SMS), e-mail e outras.
Segundo a secretária da mulher, Lídia Moura, a medida protetiva é eficaz e salva vidas. “Alguns agressores, quando os juízes e juízas determinam, eles se afastam, outros não. Para isso nós temos alguns programas que vão fazer o acompanhamento dessas mulheres”, explica a secretária. Um dos programas de monitoramento é a Patrulha Maria da Penha, que faz rotas de monitoramento e realiza visitas ao local onde a vítima está.
No caso de Rayssa de Sá, a secretária afirma que respeitou a “autonomia da mulher”. A vítima teria conhecido a Patrulha Maria da Penha, mas não assinou a documentação necessária para ser inserida no programa.
A secretária também destaca que após o descumprimento da medida protetiva, até mesmo por WhatsApp, é importante que a vítima procure a polícia, porque o descumprimento resulta em prisão.
“É importante destacar que essa pessoa tem vários descumprimento. Ele descumpriu a medida protetiva, era uma autoridade do município e tinha o dever de combater a violência, então tem mais um erro aí. É uma pessoa que ameaçou e foi ao extremo, que retirou a vida de uma mulher”, afirmou a secretaria.
Fonte: g1 PB