Nascido no bairro Jardim Queiroz e criado na Liberdade, zona oeste de Patos, no Sertão da Paraíba, Raif Alves, de 37 anos, carrega no currículo uma trajetória que ultrapassou fronteiras e continentes, sem jamais esquecer suas raízes. Filho de Raimundo Alves, vendedor de tecidos, e de Josefa Remígio, conhecida como Preta (in memoriam), dona de casa, ele viu ainda na infância como o estudo poderia ser a chave para mudar destinos — e decidiu seguir esse caminho com determinação.
Tudo começou quando seu pai, após anos de esforço, foi aprovado em um concurso público para professor de matemática da rede estadual. Para o pequeno Raif, aquele foi o primeiro grande sinal de que o conhecimento era uma ferramenta poderosa. A base foi construída nas escolas públicas de Patos, como o Coriolano de Medeiros e o CEPA (Monsenhor Manoel Vieira), onde a família enfrentava, como tantas outras, limitações financeiras. A mãe, por exemplo, vendia picolés no intervalo da escola onde o marido ensinava para complementar a renda.
Apesar das dificuldades, os estudos sempre foram prioridade. Raif e seu irmão Rafael — que viria a se formar em História — passaram nos vestibulares de universidades federais na primeira tentativa, sem cursinhos pagos, apenas com esforço e disciplina. As escolhas acadêmicas dos irmãos, muitas vezes vistas como “pouco rentáveis”, nunca foram motivo de arrependimento. Pelo contrário: foram combustível para sonhos maiores.
Durante a graduação em Administração, Raif morou fora de casa e enfrentou novos desafios. Para estudar inglês, vendia parte do vale-alimentação do estágio no Banco do Brasil e, mesmo com sacrifícios, persistiu. Trabalhou em João Pessoa no setor de telecomunicações e, com um salário modesto, sonhava em juntar dinheiro para comprar seu primeiro imóvel. Mas o destino tinha outros planos.
Em 2014, a virada. Uma amiga que morava na China o incentivou a tentar uma bolsa de estudos em Hangzhou. Com coragem, reuniu documentos, conquistou cartas de recomendação e foi aprovado. Vendeu as economias guardadas para o apartamento e embarcou para uma nova vida. O desempenho no mestrado foi tão bom que lhe rendeu uma bolsa integral para o doutorado na Zhejiang University, uma das universidades mais prestigiadas da China — e do mundo. Lá, se especializou em Neuromarketing, área que une neurociência e marketing para compreender o comportamento do consumidor.
Hoje, com fluência em inglês e domínio do mandarim, Raif atua na mediação de parcerias entre Brasil e China, promovendo negócios, inovação e desenvolvimento. Seu trabalho envolve pesquisas, traduções, negociações e a ponte entre duas culturas que, apesar da distância, têm muito a trocar.
A vivência na China trouxe novas perspectivas. Segundo Raif, o país tem uma política educacional robusta, que valoriza o professor como figura de prestígio e estimula desde cedo as múltiplas inteligências das crianças. Um exemplo disso é a nova diretriz que entra em vigor em setembro: a obrigatoriedade da educação em inteligência artificial para alunos a partir de seis anos, com no mínimo 8 horas anuais de aulas teóricas e práticas sobre o tema.
“A China está formando hoje os talentos que vão dominar o mercado de amanhã”, afirma Raif, que recentemente presenciou o lançamento da Deepseek, assistente de inteligência artificial criada por um ex-aluno da Zhejiang University. A ferramenta gratuita, sem limites de mensagens, causou impacto global ao superar concorrentes como ChatGPT, provocando perdas bilionárias no mercado de tecnologia.
Hoje, prestes a concluir o doutorado, Raif já atuou em empresas como a Shein e segue focado em fortalecer os laços comerciais e educacionais entre o Brasil e a China. Mesmo longe da família, mantém contato pelas redes sociais e recebe com gratidão o carinho daqueles que acompanharam sua trajetória desde os tempos difíceis no Sertão.
“As pessoas se espantam quando percebem onde eu cheguei. Mas tudo começou com a decisão de estudar, mesmo sem ter quase nada. A educação me levou para o outro lado do mundo, me deu uma carreira e me transformou como ser humano”, resume, com a simplicidade e convicção de quem conhece o valor de cada passo dado.
A história de Raif Alves é mais do que uma biografia inspiradora. É a prova de que o conhecimento pode ser ponte entre o Sertão e os centros globais de inovação. É o exemplo de que, quando a educação é prioridade, nenhuma barreira é intransponível — e o mundo inteiro pode caber dentro dos sonhos de quem acredita.
Por Patos Online
Com Portal TV Sol